03 fevereiro, 2007

Pão sem circo, ou melhor Palhaçada

É famosa a política do pão e do circo, embora o circo aí seja entendido sempre de maneira desonrosa, desnecessária, sem significar o que deveria: cultura. Sim, precisamos de cultura, no sentido amplo da palavra (afinal, definir cultura, de um certo modo, é definir a própria maneira que cada um arruma para viver), mas também de arte, de bem estar. Não queremos só comida não, não queremos só pão, tampouco só vigias que nos cerquem de todo o mal. Quanta ingenuidade, já que o mal está entre nós, criado e perpetuado por nós...
Viagem? Não. Na minha cidade houve alguém que resolveu escolher entre cultura e segurança, como se fosse possível misturar alhos com bugalhos e, no lugar de um museu, resolveu abrigar um bando de homens fardados, chamados de guardas municipais. O que é mais importante, ter cultura ou estar seguro? Até que ponto uma Guarda Municipal traz segurança? O que é melhor, inaugurar um museu ou trocar uma corporação municipal de endereço? Nem se trata de discutir isso. Mas o que aconteceu na cidade onde nasci, e que, com todos os problemas, é um lugar que amo e que gostaria de ver prosperar, é que o prefeito decidiu colocar em um prédio HISTÓRICO, antiga estação de trem da cidade, e que há anos vem sendo aguardado para abrigar o Museu Municipal, a Guarda Municipal que JÁ TEM UMA SEDE e, até onde se sabe, não teria necessidade de mudar de endereço. Detalhe: no prédio onde funcionaria o museu, e para onde deverão ir os fardados, estava a Biblioteca Municipal, que agora foi para o Centro Cultural da cidade. Aqui faz-se necessária outra explicação: O Centro Cultural só começou a funcionar recentemente, há seis anos, por pressão de alguns representantes da classe artística, repito ALGUNS, porque ficou 14 anos sendo um elefante branco na cidade, uma obra faraônica sem nenhum valor, aos olhos de muitos. Pois bem, e o que dizer do nosso museu? Hoje é uma salinha, uma reles salinha na antiga Cadeia Pública de Mogi Guaçu, minúscula. Seu acervo praticamente todo está guardado, sim, guardado, bem longe dos olhos da população por falta de espaço adequado. A luta para levar a Biblioteca para o Centro Cultural foi também, durante os últimos anos, a luta para readequar o Museu para que ele pudesse ser realmente da comunidade.
Sim, se muitos lerem esse meu desabafo vão dizer, é porque ela é filha da gerente de cultura, que pensou essas mudanças e sonhou com elas. Sim, mas e daí? É pecado defender uma idéia só porque ela também é de uma pessoa ue, por ac aso, é sua mãe? Isso desmerece, de alguma maneira, o seu caráter coletivo? Pode ser, sim, que ela esteja errada, que seja mais importante levar a Guarda Municipal para um prédio histórico do que mostrar um acervo de museu a uma cidade. Eu acredito piamente no contrário, e não é porque se trata da minha mãe. É porque acredito que não basta termos guardas e sentinelas para termos uma boa cidade. Se houvesse mais pontos culturais e, principalmente, um acesso maior a todos, talvez os tais guardas não tivessem tanto trabalho em conter ações de vandalismo e cuidar do patrimônio público - afinal, até onde sei, em tese é para isso que as guardas municipais, em princípio, servem.
Estou MUITO PUTA com essa história, tanto pessoalmente quanto como cidadã, embora não viva mais aqui. E mais triste ainda fico porque os que se dizem artistas e cidadãos daqui nada fazem, nem levantam a voz sequer para expressar um descontentamento. Está tudo como está...
Talvez eu também tenha parte de culpa nisso. Talvez não. Tenho. Porque só estou aqui, covardemente, escrevendo neste blog. Poderia sair gritando, levantando bandeiras e mexendo a bunda da cadeira para tentar mudar alguma coisa. Não o faço por conveniência, por medo de prejudicar quem não merece ser prejudicado, e talvez por receio de ser uma voz sozinha gritando contra o vento. Sou covarde agora e em vários outros momentos. E me penitencio por isso. Mas ao menos faço aqui um mea culpa e um desabafo: que raio de cidade é essa, meu Deus!!!!!! Que raio de administrador é esse para fazer um circo destes com algo que é tão sério????
Desculpe, seu prefeito, mas é lamentável esta decisão.

Um comentário:

Anônimo disse...

Cultura (as formas de arte) pressupõe inteligência ou, senão, feeling. Paixão pelo aprendizado, pelo próximo, pelas emoções mínimas do ser humano. Há que a tenha (cultura) e a faça importante, para si e para os outros, vendo o próximo conhecer-se e crescer. Aprender. Viver. Vivenciar. Para se ter cultura há necessidade, antes de tudo, de se ter coração. Tesão. Vontade de crescer junto ao todo e ver este todo evoluir, com cumplicidade e sensações próprias.
Política (incluindo a de segurança) pressupõe a troca necessidade-voto. A dúbia relação voto-poder. A real essência poder-dinheiro. No fim, a fórmula dinheiro-benesses, quase sempre criada para si e o seu "grupo" restrito, que sempre pensa igual e tem a mesma linha “cultural”: a cultura do eu-por mim-para mim.
Por isso há artistas e políticos. E são diferentes. Um artista tem que ter a política clara em seu mundo, para mudá-la, denunciá-la, melhorá-la, fazê-la voltada ao homem. Um político raramente faz-se artista. E nem sabe o que isso seja. O poder corrompe e dá, mesmo que este dar seja meramente material e passageiro, em cifrões o que o artista ganha em “senões” (já que cada nova pergunta do povo faz-se aprendizado e crescimento).
No mundo há um ou outro (artista e político). E essa é a questão. Um ou outro. E cada homem, por si só, decidirá que caminho seguir. O poder da sua terra, como você diz, fez valer a decisão dele. E a história um dia cobrará esta decisão...
Cuide-se. E continue artista. Alerta, “revoltada” e apaixonada pelo próximo.
Beijos...
Ronaldo Faria