23 fevereiro, 2010

Além do arco-íris

Um final de viagem tem como saldo uma porção de picadas de pernilongos, mutucas e borrachudos que coçam pacas. Tem também uma coleção de dores: nas costas, nas pernas, e algumas marcas de sol. Mas tem ótimas histórias pra contar, várias quebras de tabu ao meu respeito e a certeza de ter vivido aqueles momentos que, quando a gente junta, pode se dizer que é uma pessoa feliz.Depois de ter passado uma semana no Rio de Janeiro, em meio a blocos carnavalescos, muito barulho, muita gente, e muito, muito calor, parti para uma viagem a dois para a Praia do Bonete, em Ilhabela. A ilha eu tinha conhecido muito criança e nem lembro direito. Tudo o que tinha ficado na minha memória era uma foto no colo da minha mãe, ela usando aqueles óculos tipo vespa que a gente morria de rir quando via as fotos e hoje se mata pra comprar porque é última moda. Pois bem. Eu, a reclamona, a fracote, a que foge de situações de desconforto, topei ir para uma praia não deserta, mas bem bucólica, no meio do mato, e andar 12, eu disse DOZE quilômetros de trilha. Fui encorajada pela companhia, um moço muito do corajoso e porque não dizer doido - duas vezes, por fazer isso e por me levar - e também porque no final do ano havia feito duas trilhas e, pasmem, havia gostado. Logo eu, que sempre disse que não gostava desse tipo de coisa. Pois bem. Tendo mordido a língua, resolvi ousar.
Foram 5, CINCO horas de caminhada pesada. Sim, pesada. A trilha tinha subidas que eram verdadeiros muros, minha gente. Você tinha que escalar, ir segurando com a mão no chão e nas pedras para não cair. Mesmo assim, eu caí, e caí feio. Mas só uma vez. Juro! Quase morta, vários "muros" escalados, três cachoeiras lindas, daquelas de filme, paisagens inesquecíveis - teve até arco-íris - e muita lama depois, lá estava eu, na Praia do Bonete.
Foram dois dias e meio de pousada na praia, café da manhã e jantar com vista pro mar, céu azul, sol brilhando, água do mar no estilo "Lagoa Azul", só faltando a Brookie Shields (é assim que escreve?) e uma ótima companhia. Praticamente uma lua-de-mel sem ter me casado. Nunca pensei que fosse me sentir bem e feliz num lugar onde não há NADA pra fazer, a não ser namorar, nadar, tomar sol e olhar a paisagem. Sem TV - descobrimos que até tinha TV, mas só no final da viagem - sem muita gente (apenas pouquíssimos turistas, uns 10, e os caiçaras da vila local), só nós dois e a paisagem. Lembrei da infância, quando deitava na calçada, depois de um dia inteiro de travessuras na rua, pé no chão, jogos de bola e subidas em árvores, para olhar as estrelas ou adivinhar a forma das nuvens. Essas coisas que hoje a gente só fala pra ser poético ou escuta em letra de música. Vi um céu salpicado de estrelas que parecia de mentira e quase amanheci na praia. Permiti-me relaxar, sim, eu, a ansiosa, a que acha tudo ridículo, sentar na areia e tentar fazer um castelo, que não ficou nada bonito...rs - desculpe Edu - mas foi o nosso castelo, e por isso era lindo. Percebi que é possível não ficar preocupado, mesmo que por pouco tempo. Percebi que muita coisa que a gente acha que não é pra gente, que não gostamos ou não conseguimos, pode não ser bem assim. É claro que não moraria num lugar tão tranquilo, mas acho que posso desacelerar de vez em quando.Na volta, mais 12 quilômetros de caminhada pesada. Achei que não fosse conseguir. Era tanto esforço que dava até barato e, de tanto olhar para o chão, olhar onde estava pisando, coisa que às vezes fazemos pouco na vida, eu já estava entrando em outro plano: terra, folhas, bichos, pedras. E durante todo o percurso de volta, borboletas azuis nos acompanhavam. Umas borboletas de um azul diferente, que nenhum pintor conseguiria imitar e que pareciam de mentira.
Estou cansada, toda picada por borrachudos, mas não me canso de lembrar do arco-íris, e das borboletas azuis. E na poesia que pode haver entre duas pessoas, em um lugar, no céu que nunca olhamos e nas pegadas que vamos deixando pelo mundo sem nem prestarmos atenção.

3 comentários:

Tatiana disse...

Gosto muitíssimo desse seu novo tom. Muitíssimo mesmo!

Mari disse...

Esse rapaz lindo é muito do corajoso e aventureiro mesmo, e pelo visto já deu um novo tom na sua vida. Pena que não consegui encontrar com vocês aquele dia! Ah! Vai ter outra.
Beijo.

Anônimo disse...

que lindo!
bjs
Má F.