16 setembro, 2008

Ensaio sobre a cegueira


No último domingo, fechando uma semana repleta de evidências de que a Lei de Murphy existe e tentando acreditar que inferno astral é coisa da nossa cabeça, fui assistir a "Ensaio sobre a cegueira", de Fernando Meirelles. Uma porrada. É só o que posso dizer, o que, no meu vocabulário aqui aplicado quer dizer "um filme bom mas difícil de assistir", daqueles que deprimem a gente e fazem pensar o quanto o ser humano pode ser horroroso ou, melhor dizendo, o quanto somos animais escondidos sob uma capa de valores bastante questionáveis e frágeis.
Não havia lido o livro, infelizmente. E isso é uma vergonha, embora ache que as coisas têm a hora certa para acontecer, inclusive descobrir uma obra literária, um filme ou uma música. Mas enfim. Também não vou ficar analisando aqui a atuação dos atores- aquela Alice Braga só é bonita, mas deixa muito a desejar - nem o roteiro (ainda não entendi porque tudo foi rodado em São Paulo se era para deixar o filme falado em inglês e com referências gringas, talvez pelo caos que a Babilônia Paulistana represente...). Enfim. O fato é que o filme, e o livro tenho certeza que muito mais, nos faz refletir sobre o tal poder da imagem, ou do que se vê, ou melhor, o do como se vê, implícitas aí todas as idéias que fazemos do que é certo, errado, abominável, admirável, preto, branco, homem, mulher, gentileza,vontade, respeito, aspirações, etc.
A porrada é tão forte, especialmente no quesito respeito e igualdade sexual das mulheres, que muitas, na sala onde eu estava, se levantaram num determinado momento da sessão e foram embora, se recusando a assistir ao caos causado por humanos desprovidos de visão e de "humanidade", aos se "servirem" de fêmeas numa barganha por alimento e sobrevivência.
Pensei no quão privilegiados (ou não) somos nós, que vivemos no mundo dito civilizado, e o quão é frágil a bolha que nos separa deste caos, o caos da miséria, o caos da loucura, dos estupradores, dos desprovidos de caráter, dos corruptos, de seres como o cidadão que tem me ligado todos os dias, e agora também às noites, há meses, passando trote, dizendo obscenidades e o pior: me chamando pelo nome. Estamos cegos de tanto ver e de tanto sermos vistos. Isso aqui, o blog, é um exemplo disso. Se cada um de nós der um "google", acharemos nossa vida em rede mundial, quiçá até telefone, conta bancária, tipo sanguíneo...Daqui a pouco teremos um chip que estará monitorando nossas emoções e já não saberemos mais o que realmente estamos sentindo...
Bem, já não podemos trepar sossegados, beber sossegados, fumar e, pasmem: até nossa batata frita gorda de cada dia e cada mesa de bar estão querendo regular. Ligam para nossas casas e nos fazem ameaças. Dizem que dormiram conosco pessoas que sequer sabemos quem são. Estamos a um passo do colapso? Será que estamos ficando cegos de tanto (não) ver?

2 comentários:

Anônimo disse...

Muito foda. Adorei!

Unknown disse...

Belo texto, Ligia! Mas que foda isso o que está acontecendo contigo, hein? Não tem identificador de chamadas na sua casa? Aproveita que o grampo tá na moda e faz um....rs

Saudade, hein!