27 julho, 2010

Da falta de gentileza no mundo

Um rapaz chega no guichê de Recursos do Departamento do Sistema Viário da Prefeitura de São Paulo, que fica dentro do prédio do Detran, e pergunta para a mulher de rabo de cavalo alto, cabelos encaracolados e tingidos, cara de pouco caso:

- É o seguinte, deixa eu te explicar o meu problema.

Quando ela ouve essa frase, já faz aquela cara de falta de paciência. O rapaz, daqueles que falam bem pausado, respirando entre as palavras, continua.

- Eu fui multado indevidamente, porque a placa da minha moto não é essa. Entrei com recurso e em primeira instância não foi deferido. Mas a placa está errada (diz o número da placa anotada e da placa da moto dele).

A mulher olha para o teto, bufa, faz cara de quem quer apertar a tecla FF para ver se o cara sai mais rápido da frente dela.

- Eu preciso de um comprovante de pagamento da multa para apresentar o recurso em segunda instância porque meu despachante pediu.

No que ele fala isso a mulher irrompe, agressiva:

- Pela lei o senhor não é obrigado mais a pagar nada. Há 4 meses a legislação mudou. Agora, se o seu despachante e você querem esse comprovante isso é problema seu e dele!!!

Assim, do nada, de graça, uma patada que atirou o rapaz meio metro longe. Eu, que estava do lado, me senti agredida. No meu caso, a atendente foi monossilábica apenas, mas quando comecei a perguntar demais, vi que ela apertava mentalmente a tecla FF, como se não suportasse a minha presença ali.

Agora eu pergunto: como é que uma pessoa dessas, que não sabe conviver com outros seres humanos, que se aborrece de ser "importunada" em seu mundinho, mesmo sendo paga para atender os outros, é escolhida para trabalhar com o público?
Que tipo de cidadãos e seres humanos teremos se quando vamos a uma repartição pública somos tratados como débeis mentais?
Como as autoridades falam em menos violência, se a violência começa dentro das repartições públicas?

Quando saí do prédio do Detran, encontrei na calçada um senhor simples, dizendo que quase perdeu a cabeça e pulou no pescoço de outra atendente tamanha a grosseria. Uma grosseria de graça.

Eu fico pensando que a gente é um povo muito do pacífico mesmo, porque o rapaz que foi maltratado na minha frente na repartição, mesmo com toda a estupidez da mulher que o atendia, não subiu o tom um só instante. Há leis que protegem os funcionários de bancos e repartições de serem maltratados pelo público, mas parece que a recíproca não é muito verdadeira. Há funcionários que basta terem um guichê ou uma mesa na frente se investem de uma armadura que os separa dos pobres mortais e faz com que esqueçam que eles também têm de pegar filas, aguentar burocracias e a falta de gentileza de gente como eles, que nem podem ser chamados de animais em sua educação, dado que os animais apresentam comportamento mais digno.

Pagamos por isso. Pagamos para passarmos raiva e sermos humilhados e implorarmos por um serviço que é nosso direito. E depois pagamos mais, por milhões de campanhas contra a violência no trânsito, para sinalizarem os metrôs sobre assentos preferenciais e campanhas que dizem para que as pessoas não se estapeiem e se empurrem feito manada na entrada dos trens. Pagamos pela nossa falta de civilidade.

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